segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

2.010. O ANO DE TAPICHI. NÚMERO 43



"SENHOR PREFEITO, SENHORES VEREADORES DE SÃO MIGUEL ARCANJO:

Antes que todos os senhores fossem, eu já era.
Eu fui Tapichi.
Durante meio século eu fui o mendigo Tapichi.
É com ch que se escreve , não com x.
Tapichi significa nonato e nonato significa feto encontrado no ventre de uma vaca morta ou de mulher pobre e desconhecida.
Senhor Prefeito, senhores Vereadores: o que eu venho pleitear é uma estátua ou um busto em minha homenagem, em qualquer ponto da cidade de São Miguel Arcanjo.
Entendam, senhores, que não há nenhuma vaidade nesta pretensão, já que em alguns lugares belos e amorosos do mundo cachorro vira monumento para glorificar a humildade.
E é a humildade que eu quero engrandecer, o único gesto humano que pode salvar nossa Terra a partir de 2.010.
Ninguém, em São Miguel Arcanjo, sabe de onde eu vim --- e os que sabiam já se foram.
Eu viu de onde estou agora.
E é daqui, sempre eterno, que eu posso contar um segredo para os senhores.
Vivi anos e anos como mendigo em São Miguel Arcanjo em obediência à vontade de Deus.
A minha missão era serenar o coração das pessoas, com estas tarefas que Deus me passou:

1. Ser o dono generoso de todos os cães vadios e abandonados e dormir com eles nas calçadas.
2. Não ficar pouco tempo nem demorar muito no mesmo lugar.
3. Estender as mãos, todos os dias, com a esperança de alguém a apertar num cumprimento amigo, sem medo.
4. Tomar um banho de chuva com meninos magrinhos de peito nu.
5. Não bajular os ricos e poderosos nem menosprezar os mais pobres e humildes pelo medo de se tornar um deles.
6. Acompanhar sempre as procissões de São Miguel e outros santos, mas nunca carregar o andor para estar entre os eleitos.
7. Jamais deixar defunto pobre passar uma noite num velório sem ninguém.
7. Permitir que uma criança triste pela miséria humana atire com suas últimas forças uma pedra, só para se vingar das injustiças e sorrir um pouco.
8. Não condenar aquele amor que as mulheres vendem em casas e esquinas, mas revelar o outro amor, que não se compra nem se vende, para que suas almas não pesem tanto.
9. Correr com as crianças pobres atrás de varas de rojão e cair com elas a catar sonhos no chão.
10. Comer um pedaço de pão como se fosse a primeira e última vez.
11. Cantar baixinho, uma tarde por ano, para os mortos do cemitério.
12. Cantar alto, uma vez por ano, para os mortos da cidade.
13. Amar a vida como um cego, não pelo que se vê, mas pelo que se sente.
14. Dançar, no largo da matriz, com a música da banda ou com a música dos anjos, que poucos ouvem.
15. Colher uma laranja madura, nascida por si mesma, a esmo, sem dono, e agradecer: Grato, meu Deus.
Senhor Prefeito e Senhores Vereadores:
Foram tantas as tarefas que páro por aqui. Não quero aborrecer ninguém.
Só espero que os senhores entendam, aceitem e aprovem minha petição.
Não falei ainda com Deus, mas acho que ele vai gostar.
Os passarinhos também.
Respeitosamente, Tapichi ( O mendigo eterno)."

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

FAÇA DE CONTA QUE É NATAL. ANO 1. NÚMERO 41

O DESAMOR A SÃO MIGUEL:

SUA HISTÓRIA VIRA PÓ

QUE O VENTO CARREGA


Ailton Sewaybricker, que é uma das estrelas do Cruzeiro do Sul, e Orlando Pinheiro, dois são-miguelenses como eu, vêem nossa casa cair e lamentam muito. Eu, também. Na nossa casa viviam o Luís Valio, o Calixto João, o padre Chico, a Izabel Terra, o Fouad, o Harif.
Nossa casa era cheia de histórias. Nela se falava muito mal do demônio e muito bem de São Miguel Arcanjo. E as crianças se encantavam diante de suas portas ou abaixo de suas janelas.
Em nossa casa nasceu o futuro de uma cidade.
Mas, o futuro, quando é um filho ingrato, mata a própria mãe, que é a história.
Ainda é possível salvar?
Depende do amor filial de quem governa a cidade.
Mas, como eles são políticos, fica um certo medo. É que, infelizmente, quase todos destróem a história, porque a história só carrega heróis. E poucos políticos chegam a tanto.


CASAL DE SÃO MIGUEL

BATE UM RECORDE


Zeco e Lúcia.
Uma bela dupla caipira.
Gente bonita do sítio.
E os dois merecem entrar no Guiness pelo recorde de produtividade: 15 filhos!
Zeco tem pouco mais de 40 anos. Lúcia, um pouco menos.
O casal e os 15 filhos apareceram numa reportagem do Jornal Cruzeiro do Sul, de Sorocaba, uma prova de que gente de São Miguel Arcanjo não costuma brincar em serviço, muito menos quando apagam a luz.
E Papai Noel como é que fica numa hora dessas?
Seria bom saber do próprio Papai Noel se ele não precisa de ajuda. E se for preciso alguma coisa, ajudar um pouco não custa nada.
Talvez o Prefeito, talvez o Padre, talvez você e eu possamos homenagear com um pequeno presente essa família de São Miguel Arcanjo que é um exemplo de produtividade e união.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

SEMANA DO PUM. DE 9 A 16 DE DEZEMBRO. ANO 1. NÚMERO 40


O AQUECIMENTO GLOBAL
COMEÇOU EM SÃO MIGUEL ARCANJO COM
O PUM DAS VACAS
Havia uma velha estufa em São Miguel Arcanjo, onde fica hoje o clube Bernardes Júnior. Mas não foi lá que começou o Efeito Estufa.
Joaquim Maestro já dizia, a fumar na janela seu cachimbo da tarde, que o mundo iria acabar com um peido (desculpem essa palavra grosseira, mas se o Presidente fala merda na TV, eu posso falar peido, que é muito mais leve).
Nestor Fogaça concordava com Joaquim Maestro e pensou até, numa das vezes em que foi Prefeito, em proibir peidos em lugares públicos, como o cemitério em dia de grandes enterros, o campo de futebol, a piscina do Abdala Jabur, o Largo da Matriz (e também atrás da Igreja). E seriam severamente penalizados os que liberassem seus gases durante as procissões (Missa, nem pensar).
Mas, não havia amparo legal para Nestor Fogaça e os peidos explícitos (que se ouvem) e os implícitos (silenciosos) continuaram a subir pelos ares, sem que o Vento do Mar os dissipasse.
Mas, o problema maior não era a flatulência de senhores e senhoras respeitáveis ou de gente mal-educada.
O Pum das vacas é que enchia mais o ar de gases.
De Pilar do Sul, já se avistava a nuvem de dióxido de carbono a crescer sobre São Miguel Arcanjo.
Foram convocados os criadores de vacas leiteiras para resolver o problema, que não se resumia só no cheiro, mas também na falta de ar. Compareceram Benedito Terra, Chico Rosa, Tiago França e Anibal Coelho, entre outros.
Todos ouviram a sugestão de Nestor Fogaça para tapar o buraco das vacas dez horas por dia. Apesar de certa estranheza, houve concordância geral, com uma ressalva: o horário do tapa-buraco não poderia ser generalizado, já que havia algumas diferenças.
As vacas de Dito Terra, segundo ele mesmo disse, soltavam Puns das 4 às 7 horas da manhã.
As do Tiago França preferiam a noite.
O Chico Rosa, que também tocava uma padaria no Largo da Matriz, nem sabia em que horário suas vacas ventavam e poluiam o ar.
O Anibal Coelho jurava nunca ter reparado numa coisa dessas, porque há bom tempo andava meio surdo e com sinusite.
Assim, as vacas, em sua santa ignorância, continuaram a peidar livremente e começava em São Miguel Arcanjo o efeito estufa e o aquecimento global, que se espalharam pelo mundo meio século depois.
E o planeta pode acabar assim: Pum!!!

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

AS TRÊS PRAGAS DE UMA CIDADE. DE 1 A 8 DE DEZEMBRO. ANO 1. NÚMERO 39


Sabe ao lado de quem voou Tapichi no último Vento do Mar?
Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel Arcanjo (às vezes, ele aparece), voou ao lado do índio Don Juan, bruxo e mestre de Carlos Castañeda nas suas peregrinações pelo deserto de Sonora, no México.
Tapichi, em pleno vôo, ouviu de Don Juan o seguinte recado:
Diga ao povo de São Miguel que a praga de uma cidade são as pessoas que se acham mais importantes que o Sol da manhã. A auto-importância, esse pensar só em si mesmo, cria três tipos de gente que atrasam o mundo. São estes os três tipos:
Os Mijos.
Os Peidos.
Os Vômitos.
Os Mijos são os puxa-sacos, esses aduladores que fazem um favor aqui, outro ali, cuidam disto ou daquilo e assim disfarçam que não têm nenhuma iniciativa própria e nunca chegam a nada por si mesmos. Sempre precisam de alguém que mande. Também esperam ser reconhecidos tanto quanto adulam. Como é impossível uma coisa dessas, sentem-se feridos e vivem chorando, encostados nos postes da vida.
Os Peidos são o lado avesso dos Mijos. Donos do mundo, vivem a interferir em tudo, não deixam ninguém em paz. Entram sem pedir licença. Saem sem se despedir. Não respeitam o espaço alheio. Com a maldita vocação para manda-chuvas, são capazes de matar para serem donos de qualquer coisa.
Os Vômitos vivem em cima do muro e acima do bem e do mal. Intocáveis e presunçosos. Mas, não passam de uma caricatura da realidade. Se ninguém prestar atenção na sua existência, eles se desfazem na insignificância de uma mariposa na boca de um sapo.
O recado do indio Don Juan foi dado. Agora, é com a consciência de cada um saber quem é Mijo, Peido ou Vômito. E se transformar depressa para o bem da cidade.


terça-feira, 24 de novembro de 2009

SEMANA DA CORAGEM. DE 24 A 31 DE NOVEMBRO. ANO 1. NÚMERO 38

Mãe Terezinha se dividiu em seis:
Dete
Fátima
Dora
Penha
Carmo
Abilinha
Essas seis se tornaram uma, igual à doce mãe multiplicada.
Doce mãe porque era mesmo um doce.
Pão doce, doce de abóbora, doce de cidra, chá de erva doce, a mãe Terezinha foi adoçando a alma das meninas e se alguma azeda de vez em quando é um azedinho doce.
Na casa dessas seis mulheres, a mãe Terezinha continua viva no inesquecível cheirinho de tempero de feijão, que sobe aos céus de São Miguel quando são 10 horas e o relógio da Igreja bate.
(Felicidade de um homem é feijão bem temperado à mesa e mulher destemperada na cama. Se mãe Terezinha ouvisse uma coisa dessas, mandaria as seis filhas já pra dentro)
Nunca houve destempero entre essas seis mulheres, porque a lição de mãe era a de espantar Coisa Ruim com a oração de São Miguel e prender as saias entre os joelhos quando soprasse o Vento do Mal, também chamado de Vento do Mar.
Na Casa das Sete Mulheres (porque mãe Terezinha continua entre elas) ninguém serve o pão que o diabo amassou aos que chegam cansados da vida. Muito menos água com açucar.
O pão é de Deus multiplicado e o café é mais forte que qualquer desconsolo.
Na Casa das Sete Mulheres, o medo da vida não entra. Nem o medo da morte. E a coragem não é de ranger os dentes, mas de sorrir.
Sorrindo da vida, sorrindo da morte, elas seguem o doce destino de fazer pão e fazer o bem sem olhar pra quem
.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

SEMANA DO TERÇO. DE 10 A 17 DE NOVEMBRO. ANO 1. NÚMERO 37

Um cesto porta-ovos, feito com lágrimas de Nossa Senhora ou contas do rosário.
O designer é de Fabíola Bergamo. A foto é de Marcelo Uchoa.
Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel Arcanjo (às vezes, ele aparece), captou lá no alto, onde flutua, um ponto de interrogação. Correu à procura de Kabir, o santo-poeta que passou com seus versos pela Terra no Século XV.
--- Santo Poeta, estou em dúvida: ouvi falar e espalhei por aí que Deus gostaria muito que as mulheres rezadeiras fizessem cestas para ovos com as contas do rosário, enquanto puxam o terço. Depois de cada oração, sairia uma conta do rosário para montar a cesta. Se a fé agrada a Deus, fé e trabalho agradam muito mais. Falei bobagem?
Kabir disse: Não!
--- Eu também falei que Deus gostaria muito que as mulheres rezassem em silêncio. Falei bobagem?
Kabir disse: Não! Deus gosta de silêncio.
--- Mulher com as mãos ocupadas a montar cestas para ovos, enquanto puxam o terço quietinhas, isso não é uma benção?
Kabir disse: Sim, porque Deus é o eterno silêncio além do barulho do mundo.
--- Eu também falei que as vozes ardidas das mulheres rezadeiras incomodam muito o Senhor das Alturas, principalmente quando rezam à noite e desrespeitam a Lei do Silêncio, que é a mais sábia Lei de Deus.
Kabir disse: É no silêncio que os milagres acontecem.
--- Eu também falei para que reparassem nas galinhas. Em silêncio, elas esperam o grande milagre da passagem do ovo. Só depois que o ovo passa elas cantam, aliviadas.
Falei bobagem?
Kabir disse: Sim.
--- O silêncio é mais estrondoso que o trovão. Também falei que depois que a banda passa é tão gostoso o silêncio que fica. Falei bobagem?
Kabir disse: Não. No silêncio Deus fala. Silenciosamente.
--- Mas por que as mulheres falam tanto?
Kabir disse: Para cumprir um dos papéis de mãe. Se as mulheres não falassem tanto, nenhuma criança aprenderia a falar.
--- Tenho uma última dúvida: elas rezam o terço por uma questão de fé ou só para falarem mais um pouco?
Kabir disse: Isso só Deus sabe.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

SOL DE SÃO MIGUEL. DE 2 A 9 DE NOVEMBRO. ANO 1. NÚMERO 36

Numa saudade feita de domingo, eu sentí que o Sol de São Miguel tem cheiro de laranja madura que o vento vai espalhando por cima dos muros e deixa quem passa com água na boca.
Mas, o Sol de São Miguel é o mesmo Sol de quem está longe, retrucou certa vez nossa dona Sebastiana, professora e nossa dona no Grupo Escolar. É um Sol só, não existem dois, disse ela.
Será?
Acho que nossa dona Sebastiana errou a conta e digo com a plena certeza de quem vê as coisas com saudades daquele outro Sol que passa em São Miguel.
É um Sol diferente, de manhã ou à tarde. E por ser diferente é que galo nenhum fica indiferente e levanta a crista e canta.
Em outros lugares, de outro Sol, os galos vivem quietos e bocós, de crista caida, porque ciscam sombras tristes que os corações deixam pelos caminhos.
O Sol de São Miguel é para se abrir a janela depressa de manhã e avisar todas as Marias:
Abre a janela, Maria,
Que é dia
São 8 horas e o Sol já chegou
Os passarinhos fizeram seus ninhos
Na varanda do seu bangalô
Pergunte a um homem de ciência --- e que seja dos bons --- por que o Sol de São Miguel brilha mais numa gota de orvalho que outro Sol. Ele não vai saber responder. Mas, o Tio Miguér, o poeta da Terra, tem a resposta. É só pedir um verso, que ele conta.
POR FALAR EM SOMBRA
E ÁGUA FRESCA
Compare o que se ouve hoje por aí com o que se ouvia antigamente na farmácia do Antenor Moreira, em São Miguel Arcanjo, com direito a sombra e água fresca.
1.
Ele anda cansado. Pode ser depressão.
Ele anda cansado. Pode ser amarelão.
2.
Ela trabalha na Globo. É sapatão.
Ela trabalha descalça. Colhe algodão.
3.
Será que ainda existe jornal limpo?
Será que ainda existe gente que limpa com jornal?
4.
Ela chegou na TV com uma mão na frente e outra atrás. Tirou a mão da frente e acabou famosa.
Ela chegou em São Miguel Arcanjo com uma mão na frente e outra atrás. Tirou a mão da frente e acabou na Zona.
5.
Ele é tão metido a chique que chama médico de Nova York sem ter doença nenhuma.
Ele era tão metido a chique que só chamava médico de Itapetininga quando a doença já havia passado.
6.
Ele vai se separar. Ela entrou no círculo vicioso da TV.
Ele vai se separar. Ela entrou no circo vicioso do Peroba.
7.
É um garoto-problema.
É um fdp sem vergonha.
8.
O que sobra na nossa política é ladrão.
O que ainda falta na nossa política é um pouquinho de ladrão.
9.
Ele não tem vergonha de mostrar os chifres por aí.
Ele morreu de vergonha e foi enterrado ontem.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

SEMANA DA HUMILDADE. DE 25 A 1 DE NOVEMBRO. ANO 1. NÚMERO 35

UM HOMEM SEM MEDO
Milton e Maria. Dois versos da vida. Um verso de coragem, outro de alegria, combinados na velha rima de que no largo da Matriz sempre se forma um casal feliz.

1. Hoje que o mundo é feito de medo, feliz daquele que conheceu três homens sem medo nenhum.
Milton era um deles.
Milton Sewaybricker.
Ele, José Monteiro Terra (Trincheira) e Tonico Ortiz formavam um trio que exercia em São Miguel Arcanjo o pleno direito de ser dono de si.
Ai de quem levantasse um dedo mandão ou autoritário.
Ai de quem pisasse em pé de pobre.
Ai de quem se erguesse contra o sagrado direito de ir e vir.
E ai de quem imaginasse que aquele corpo magro do Milton significava fraqueza. Seria surpreendido pela extraordinária força de um dos mais competentes mecânicos de São Miguel Arcanjo e um dos mais generosos: nele se penduravam os donos de caminhão com problemas na vida e na biela.

2. Ah, um amigo como o Milton, onde encontrar nestes tempos? Amigo sem medo da vida: para o que der e vier. E sem medo da morte: seja o que Deus quiser. Milton, um dos meus heróis. E que se casou com minha heroina: Maria.

Milton, um homem sem medo, portanto, um homem.



TAPICHI LIDANDO COM A ANGÚSTIA

Esta é a mais recente entrevista com Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel Arcanjo (às vezes, ele aparece). Ele parecia tomado pelo espírito de Hubert Benoit (pesquisem, que vocês vão conhecer um grande homem).


1.


--- Como a gente pode se livrar da angústia, Tapichi?


--- Só existe uma saída: a humildade.

--- Apenas humildade, Tapichi?
--- Você acha pouco??? A humildade é a mais rara virtude humana. Nas sombras da humildade sempre existe o orgulho de ser humilde. Até entre os santos existiram os que orgulhosamente se achavam mais humildes que os outros.
--- São Francisco de Assis?
--- Ah, não, eu não vou fazer fofoca.

--- Mas, de que humildade você fala, Tapichi?
--- Eu falo da humildade da humilhação!
--- Dá para explicar melhor?

---Não confunda humildade com roupa velha, sapatos furados, cara de bocó e uma boca aberta que baba amém para tudo.

--- Ai, ai, que esta conversa vai longe.
--- Você tem paciência para ficar ouvindo sem babar?
--- Claro que tenho, Tapichi. Paciência é o que não me falta: ouví muito sermão de padre quando era criança.
--- Bem, já que você está entre aqueles que não mais carregam sacos pela vida (apenas coçam), vou em frente.



--- Fique à vontade, Tapichi.


--- É o seguinte: você sabe como é que as pessoas enchem o próprio saco e ficam de saco cheio?


--- Não, Tapichi.

--- Elas vivem catando pensamentos bobos por aí.
--- O que é um pensamento bobo?
--- O pensamento sobre o que os outros pensam da gente. O pensamento de que um dia a casa pode cair. O pensamento de que a galinha do vizinho é mais gostosa ou o pinto do vizinho é mais gordo. O pensamento de que alguém viu o que foi feito escondido. O pensamento de que a Terra gira apenas em torno da gente e que o Sol só bate no nosso quintal.
--- Meu Deus, Tapichi, eu vivo pensando essas coisas.
--- É assim que a gente toca a vida girando no mesmo lugar, igual vira-lata com coceira no rabo.
--- Mas fazer o que, Tapichi?
--- É preciso sair desse círculo vicioso.

--- O que você entende por círculo vicioso, Tapichi?
--- Círculo vicioso é um ânus que sempre se senta no mesmo lugar.
--- Ai, ai, ai...
--- Desculpe a grosseria, mas não achei comparação melhor. Só fica no mesmo lugar quem tem medo de avançar. Afinal, ninguém sabe o que vem pela frente. É mais seguro ficar no lugar e disfarçar, com humildade fingida, o orgulho de ser dono do próprio mundo. Mas, um dia --- sempre haverá um dia --- em que a falsa humildade e o orgulho disfarçado vão ser humilhados escandalosamente pelo que nunca esteve escrito e nunca estará.





2.

--- Todo mundo se acha dono do mundo, Tapichi.

--- Eu sei. Todo mundo é bocó. Bocó da vida é aquele que se mete a dono do mundo e se separa de si para mandar em si mesmo e se separa dos outros com medo de perder o poder de si mesmo e se separa de Deus porque se julga o próprio deus do seu destino.

--- Ai, ai, ai...

--- O homem não passa de um asno pretensioso, mas as pernas bambeiam e ele cai de quatro quando lá do alto e bem de longe vem o sinal de sua insignificância e impotência em querer ficar fora do mundo para manejar o mundo.

--- O homem está num beco sem saída, Tapichi?

--- Ou ele aceita e reconhece sua igualdade com tudo --- com o que está acima e o que está abaixo ---ou vira um pobre diabo que chega à velhice brigando com mosquito, não importa se rei ou mendigo.



3.

--- Diga mais, Tapichi.

--- Ai de quem se julga no lado de cá o primeiro e único diante do Universo no lado de lá. Para quem vive nessa pretensão e separação, buscar Deus ou a riqueza é a mesma ambição de querer ser melhor que os outros. Por que se outro chegar na sua frente diante de Deus, ele vai sentir inveja. E se a busca for por dinheiro, ele ainda vai brigar com Deus: Por que ele e não eu?

--- O que fazer, Tapichi?

--- Nessa pretensão egoísta de cada um de nós de ir para o alto, a salvação, por incrível que pareça, é a queda. E que seja a queda mais humilhante, de invejar pedaço de pão velho na boca de vira-lata. Nessa extrema humilhação, o homem sente que nada neste mundo é mais, nem menos, e o esterco do fundo do quintal tem diante de Deus a mesma importância da estrela mais brilhante. Então, nesse abismo da humilhação o homem vai sentir que ele está em Deus e Deus está nele, como donos do mundo.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

SEMANA DO JORNAL NACIONAL. DE 15 A 22 DE OUTUBRO. ANO 1. NÚMERO 34


Houve um tempo, em São Miguel Arcanjo, em que a gente sabia de tudo sentado ali na praça, em frente da Igreja.

Sempre chegava alguém com novidade:

--- Sabe quem já está no bico do corvo?

A gente ficava sabendo e espalhava.

--- Sabe quem faz aniversário hoje?

E um abraço era reservado para depois.

--- Adivinhe quem vai se casar?

A gente ficava esperando o convite.

--- Sabe quem anda declamando uns versos bonitos por aí?

Tomara que ele não apareça logo agora para declamar, a gente torcia.

--- Sabe quem lida melhor com uma picanha nesta cidade?

A gente babava.

--- Sabe onde vai rolar o maior bailão?

Todo mundo se animava.

--- Sabe quantos cães abandonados existem por aqui?

Não valia contar os da escadaria da Igreja.

--- Sabe quem anda pintando umas telas de tirar o chapéu?

A gente ia ver.

--- Sabe quem já é doutor?

Dava muito orgulho saber.

Notícias, notícias, notícias.

Para quem vive longe, quanto mais notícias da terra a gente tiver, mais perto a gente fica.

Mandem.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

SEMANA DO MEU SUPER-HERÓI. 29 DE SETEMBRO. ANO 1. NÚMERO 33


1.
Miguel, meu super-herói Miguel.
Me perdoe a intimidade. Já me disseram que esse não é modo de se falar com um Arcanjo.
Mas, eu não sei muito bem o que é um Arcanjo.
Nos tempos de coroinha, falavam que Arcanjo é posição lás das alturas, bem pertinho de Deus. Só de pensar, dá arrepio.
Meu super-herói Miguel: não me leve a mal nem pense que é desrespeito um tratamento assim, sem aquela cerimônia que a Igreja exige. Você é meu super-herói e pronto. Desculpe, mais uma vez, essa minha intimidade. Mas, desde os sete anos de idade nem o Super-Homem, nem Tarzan, nem o Homem Aranha, nem o Capitão Marvel, nem o Capitão América me fascinavam tanto quanto a sua imponência lá no altar. Você superava todos como o meu super-herói.
Muitas vezes, eu quis que você descesse do andor ou do altar e me ensinasse a voar. Ah, se eu voasse, seria melhor goleiro que o Dito Torto, assim chamado por causa do pescoço torto e duro, que envesgava sua cabeça para um lado só. Ele ficou na história do Esporte Clube São Miguel, porque fazia milagres embaixo do gol. Também pensei, meu super-herói Miguel, em pedir sua espada emprestada para defender minha cidade se houvesse uma guerra com Pilar do Sul. A balança eu queria para pesar batata para minha avó no armazém do Nestor Fogaça. Eu tinha certeza de que haveria o milagre de dez batatas pesarem apenas cinco. Outro sonho meu era nos dias de procissão desfilar ao seu lado no andor e acenar para a Carmem Fogaça, a garota que eu amava de longe na hora do recreio do Grupo Escolar.
Ah, meu super-herói Miguel, confesso que estou com saudades.
Todo dia 29 de Setembro é assim: eu fico um pouco triste pelo tempo que passa e leva as crianças embora.
2.
Meu super-herói Miguel.
Hoje, dia 29 de Setembro, bem no seu dia, Renato Cauchiolli voou para o mundo que fica além de qualquer ilusão.
Renato do Trombone.
Claro que você se lembra dele, meu super-herói Miguel. Todo dia 29 de setembro ele chegava até seu altar, como um dos mais fiéis devotos.
Renato Cauchiolli. Meu mestre.
Ele, meu mestre, você meu super-herói, realmente eu fui um menino de muita sorte.
Você, meu super-herói Miguel, era a luz que embalava meus sonhos assim que cheguei menino em São Paulo. Renato era o som. Nós dois viemos aí debaixo do seu altar. Ele chegou na frente e me ensinou os caminhos de São Paulo com muita paciência e ternura. Peço desculpas se me desviei um pouco do rumo certo. Mas, sou muito grato pela fé que me passou, a fé em você, meu super-herói Miguel, a quem ele sempre agradecia por ser considerado um dos melhores músicos do Brasil, com um toque firme e suave, que se destacava nas apresentações de grandes orquestras da Rádio Nacional ou Rádio Tupi ou com Osmar Milani e Enrico Simonetti na TV. Também participou das orquestras de Pocho e Erlon Chaves . Gravou o LP "Trombone Carinhoso". Atuou na Orquestra Sinfônica de São Paulo, na Big Band de Nelson Aires, na TV Globo, TVS, na Orquestra do Sargentelli, que realizou longa excursão à Europa, acompanhou Roberto Carlos, no show "Emoções". Enfim, um talento musical exercido e reconhecido.
Renato do Trombone voou de nós neste 29 de setembro.
E eu tenho certeza, meu super-herói Miguel, que você emprestou suas asas para ele voar.
(Faleceu em 29 de setembro de 2.009, aos 88 anos, Renato Cauchiolli, um dos mais consagrados músicos do Brasil. Nascido em São Miguel Arcanjo, teve as primeiras lições de bombardino e teoria com Joaquim Ortiz de Camargo, o Joaquim Maestro, que sempre foi lembrado em suas entrevistas. O sepultamento: dia 30 de setembro, no Cemitério do Araçá).





domingo, 6 de setembro de 2009

CEM ANOS DE SOLIDÃO. ANO 1. NÚMERO 32

De São Miguel Arcanjo a Santa Cruz dos Matos, o peregrino percorre 100 anos de solidão. E chega a seu destino.

No fim de uma rua estreita, feita de pó, ele avista uma pequena capela. Na frente da capela, um cachorro magro, sem nome e sem dono. Portanto, um cachorro livre, que não precisa viver com o rabo entre as pernas.

Num lado da rua, pés floridos de hibiscos escondem a cerca de arame farpado.

Do outro lado da rua, capim que ninguém vai cortar, porque todos dormem e sonham que um dia haverá de passar por ali uma cabra vadia e com fome. Ou um cavalo velho e manco.

O peregrino sente que nos olhos o pó do deserto dói menos que na alma. Na alma, o pó do deserto vira solidão.

É meio-dia e não há vento nem sinal de chuva.

Tomara que nenhum galo cante. Canto de galo, ao meio-dia, é pra gente perdida no mundo.

Seria melhor ouvir outro sinal de vida. Uma voz de mulher a cantar. Algazarra de criança. Um bem-te-vi. Uma gargalhada gostosa.

Mas, o silêncio é o senhor. Soberano ao meio-dia em cem anos de solidão.

Então, a vida renasce num cheiro gostoso que vem pelo ar. O peregrino segue para o lado de onde vem o vento. Vai com fé, que a fé não costuma falhar. Depois de andar e andar, encontra uma mesa, coberta com toalha florida, perfume de manjericão, nenhuma mosca, e arrumados, muito bem arrumados, pratos de paçoca de carne, paçoca de amendoim e bolinho de frango.

O peregrino dá o primeiro bocado, o segundo, o terceiro. E no quarto, acabam 100 anos de solidão.

Isso não é felicidade?


(foto enviada por Orlando Leme Pinheiro)

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

CENTENÁRIO DE PADRE CHICO: DIA 29 DE AGOSTO . ANO 1. NÚMERO 31


1.
Assim era Francisco Ribeiro, o padre Chico:
Domingo.
Missa das onze e meia. Era um tempo em que se rezava missa às onze e meia. Tempo, também, em que havia jogos do Campeonato Paulista no mesmo horário.

Padre Chico dizia brincando que a batina preta e a bata branca eram seu uniforme de corintiano. Ele estava no altar, ansioso. O Corintians e o São Paulo jogavam no Pacaembu e ele deixara um rádio ligado bem baixinho na sacristia. Queria ouvir lá do altar a transmissão do jogo, pela Rádio Record. O locutor Geraldo José de Almeida anunciou:
--- Vai começar a partida!!! Apita o juiz!!!
Padre Chico no altar:
--- In nómine Patris et Filli et Spirictus Sancti!
Um ouvido para Deus, outro para o rádio na sacristia:
--- Baltazar passa para Luisinho, que atrasa para Roberto, na intermediária! A torcida do Corintians toma a maior parte do Pacaembu!
Padre Chico no altar:
--- Amén!!!
Rádio na sacristia:
---Cláudio avança pela direita, passa pelo zagueiro Noronha do São Paulo! Baltazar, o Cabecinha de Ouro, espera o cruzamento!
Padre Chico no altar:
--- Gratia Dómini nostri Jesu Christi!
Rádio na sacristia:
--- Baltazar mata no peito, baixa na terra ...
Padre Chico no altar:
--- Jesu Christi!!!
Rádio na sacristia:
--- E chuta para fora! Perde gol feito!
Padre Chico, no altar, bate no peito:
---Mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa!
Rádio na sacristia:
--- São Paulo no contra-ataque!
Padre Chico no altar:
--- Oremus!!!
Rádio na sacristia:
--- Bauer estica na esquerda para Teixeirinha! Defesa do Corintians aberta!
Padre Chico no altar:
--- Oremus!!! Oremus!!!
Rádio na sacristia:
--- Idário salva o Corintians e manda a bola para escanteio!
Padre Chico no altar:
--- Glória!!! Glória!!! Glória in excelsis Deo!
Rádio na Sacristia:
---Sensacional! Sensacional! Ataque fulminante do Corintians, cabeçada de Baltazar e goooollll!!! Salta o Cabecinha, 1 a 0 no placar!!!
Padre Chico se esquece que está no altar:
---Gol!!! ( E disfarça em seguida: Golus!!! Golus!!! Sanctus! Sanctus! Dóminus Deus! Jesu Christi!!!)
Conego Francisco Ribeiro. Padre Chico. Dia 29 de agosto vai ser comemorado o centenário de seu nascimento. Ele veio de Sorocaba em 1.947 e virou um são-miguelense de coração generoso. Só para lembrar: o dinheiro que recebeu de uma herança da família ele doou para a Santa Casa.
E quando a Santa Casa passou por dificuldades, leiloou seu anel de conego, feito de ouro e marfim, em benefício da instituição. Antes de padre Chico, os mortos de famílias pobres eram levados em redes até o cemitério. Alguns caíam pelo caminho. Padre Chico passou a doar caixões e as redes dos pobres ficaram em casa para vivo dormir. O ginásio de São Miguel Arcanjo tem uma boa mão de padre Chico. Enfim, como diz meu amigo Orlando Leme Pinheiro, padre Chico, mais do que tudo, era um dos nossos. Está lá em cima, no time de São Jorge. E como são-paulino, eu posso dizer, que ele é o único corintiano que foi pro céu. O resto continua no purgatório.


2.
Padre Chico no confessionário:
--- Muito bem, meu filho. Você não cometeu nenhum pecado. Deus o abençoe. Mas, me diga uma coisa: pra que time você torce?
--- Palmeiras.
--- Ah, meu filho, que pecado!!! Ajoelhe-se em frente do altar, reze cinco Ave-Maria e que Deus o perdoe.
3.

Dona Elvira era a cantora de voz mais ardida no coro da Igreja que Padre Chico organizou assim que chegou à paróquia. Ele não aguentava mais , tinha arrepios, mas se dispensasse dona Elvira, ela ficaria ofendida, o marido também. Deu um jeito assim:
--- Dona Elvira, de hoje em diante a senhora canta de boca fechada.
Todo o coro cantava de boca aberta: Ave, Ave, Ave Maria.
E dona Elvira: Hum, Hum, Hum, Hum, Hum, Hum.


terça-feira, 11 de agosto de 2009

SEMANA DA ESCURIDÃO. DE 13 A 20 DE AGOSTO. ANO 1. NÚMERO 30


Uma entrevista exclusiva com Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel Arcanjo (às vezes ele aparece).

--- Qual o grande mal de Brasilia, Tapichi?

--- A falta de gato. Onde falta gato, os ratos fazem a festa.

--- Você tem esperança que alguém do bem apareça algum dia por lá, Tapichi?

--- Nenhuma esperança. Em Brasilia, quem chega como passarinho fica aliado de morcego e acaba dormindo de ponta cabeça. O que eu quero dizer, e que São Miguel Arcanjo me perdoe, é que faz tempo que as moscas mudam, mas a bosta continua a mesma.

***

--- Se não tem solução, por que os políticos brigam tanto, Tapichi?
--- É que boca de político só fecha com terra de cemitério. A boca e o bolso. Nós vivemos num país em que a eleição faz o ladrão.
--- Uma coisa me incomoda, Tapichi: porque deputados e senadores sempre dão as costas para quem está falando?
--- Porque é de costas que jacaré nada no lugar onde tem piranha.
--- E nós, os eleitores, Tapichi?
--- Vocês são cegos. E em terra de cegos quem tem um olho é ladrão.


***
--- E essa história da presidência do Senado? O homem cai ou não cai? Você não acredita, Tapichi, que água mole em pedra dura tanto bate até que fura?
--- Não. Eu só acredito que macaco esperto com o rabo preso não mexe no rabo do outro e nem adianta jogar água nele.


***


--- Do jeito que está, qual seria o melhor lugar para os políticos, Tapichi?

--- O galinheiro.

--- Galinheiro?

--- É que de grão em grão eles enchem o papo.


***
--- Eu soube, Tapichi, que um de nossos senadores anda querendo extrair um dente torto.
--- Dente que nasce torto, não tem jeito, morre torto. Eu preferia que em vez do dente, ele extraisse os parentes.

sábado, 1 de agosto de 2009

SEMANA DA SABEDORIA. DE 6 A 13 DE AGOSTO. ANO 1. NÚMERO 29

Tantas coisas a gente pode aprender no silêncio de Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel Arcanjo (às vezes, ele aparece). Tantas coisas a gente pode aprender no vão das palavras de Carlos Castaneda e dom Juan Matus, um feiticeiro yaqui com a sabedoria do infinito. Não custa tentar aprender numa caminhada até o cemitério, antes que carreguem a gente pra lá.
1. O mundo que a gente vê é uma ilusão. A realidade fica atrás do muro. Que tal ter a coragem de pular?
2. Há uma diferença entre ver e olhar. A gente vê com o coração e ganha um pedacinho do céu. Ou olha com a ambição e ganha todo o Inferno.
3. Para ser gente não é preciso ficar contando a própria história pessoal. Se ela é pessoal, para que ficar contando? Quem apaga essa história descarrega um peso inútil e ganha a leveza da liberdade.
4. É bom a gente aprender que nada é certo e a vida é uma aventura emocionante onde ninguém sabe o que existe atrás da próxima moita.
5. Para que se levar tanto a sério ou se julgar tão importante? Assim é que a gente se separa desse misterioso universo onde o Sol passa humildemente todos os dias. E isso é realmente sério e importante.
6. Gente que fala com árvores e plantinhas do caminho não é gente louca. Elas sabem mais do que a gente o que a gente é. Que tal uma conversinha com elas de manhã?
7. Toda a impaciência acaba quando a gente pede conselhos à própria morte. Ela é a única e real companheira, diante de todas as mesquinharias da vida.
8. Num fim de tarde, no crepúsculo, a gente compreende melhor os mistérios do mundo. É bom compreender, antes que o Sol se ponha.
9. O vento tem poderes que a gente não pega com as mãos, mas com o espírito desperto.
10. Quando se fica na rotina, enredado nos mesmos hábitos e caminhos, fica mais fácil para a má sorte pegar a gente.
UMA BOA NOTÍCIA
A Prefeitura de São Miguel Arcanjo reabre o coreto.
Isso significa música na cidade todos os sábados à tarde. E música é a única linguagem em que Deus entende a gente.
Se Joaquim Maestro fosse vivo iria correndo dar um abraço em quem teve a idéia e um monte de abraços em quem subir no coreto, não importa se num sábado em Sol Maior ou em Sol Menor.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

SEMANA DA SOLIDÃO. DE 27 DE JULHO A 5 DE AGOSTO. ANO 1. NÚMERO 28



A VOCÊ, MEU AMIGO, QUE ANDA SE SENTINDO TÃO SÓ.
(Do livro Sob as Sombras do Bem e do Mal, de Miguel Arcanjo Terra)
1.
São Miguel Arcanjo da minha liberdade!
A segurança é a morte que eu não quero.
Ser livre e só, sem poder ou glória, me faz ser Deus de mim.
Se na Lei dos Homens me sinto louco, em Deus me interno.
Onde o êxito é reconhecido, não me vêem passar.
Onde o Homem está contra o Homem, eu não estou.
De mãos vazias, sigo meu destino sem vender minha alma.
2.
São Miguel Arcanjo da minha paz!
Na desordem do mundo, não ergo muros nem grades de ferro.
Nenhum bem quero, além da minha vida.
Deus não cuida das portas dos que recolhem provisões nos celeiros.
Nem dos corações dos que se inquietam com o dia de amanhã.
As minhas mãos vão se manter recolhidas.
E que nada tirem de mim, porque a vida é que se dá e cobra o que se toma.
3.
São Miguel Arcanjo da minha vida e morte!
Que eu viva e morra de instante a instante.
A dor que eu sentir, que não doa no tempo.
Na minha coragem de morrer, que eu salte as sombras do que foi.
E do que será não tema nenhum abismo.
Que na morte em vida, eu suporte a solidão e o fim dos sonhos.
E não me dobre diante dos homens.
4.
São Miguel Arcanjo da minha sabedoria!
Que a minha verdade não venha de tempos mortos.
Nem de palavras vãs ou falsas visões.
Deus quer renascer em nós.
Mas, continua sepultado sob palavras e imagens gastas.
Que eu veja, antes de pensar. E pense, antes de falar.
Assim, Deus me contará sua história.
E eu a guardarei só para mim, antes da curva do rio, além do sol da tarde, ao lado dos homens sem mundo.

domingo, 19 de julho de 2009

SEMANA DO AMIGO. DE 20 A 27 DE JULHO. ANO 1. NÚMERO 27

VIDA DE CACHORRO
Eles jamais traem um amigo. E morrem com ele ou à frente dele se preciso for. Fiéis e gratos, eles são as sombras vivas que correm, brincam e abrem os caminhos para o amigo passar. Infelizmente, esse amigo é o homem. E o homem sempre será amigo da onça e eles acabam abandonados.
(Eu lí no jornal Cruzeiro do Sul, junto com o Paulo Manoel, que em São Miguel Arcanjo os animais sofrem maus-tratos em canil superlotado e sem nenhuma estrutura. Dá vontade de morder os culpados)

Luís Carlos Felipe. Coração de São Miguel.

Ele tinha um jeito assim do cantor Sérgio Reis.
De chapéu na cabeça, mais parecido ficava.
Luís Carlos Felipe. Êta coração de ouro, que batia sem falhar pelos amigos e pela Terra, onde semeava o trigo pra tanta gente colher o pão.
Bate, bate, bate coração. Em gente boa, ele bate tanto e tanto bateu que parou.E a Terra abraçou de volta aquele que tanto gostava dela.
Luís Carlos Felipe. Coração de São Miguel.

terça-feira, 14 de julho de 2009

SEMANA DO ERA UMA VEZ. DE 12 A 19 DE JULHO. ANO 1. NÚMERO 26


Joaquim Maestro, além de maestro, era benzedor e filósofo na cidade de São Miguel Arcanjo.
Sentado num banco da praça, numa tarde qualquer, ele tentava acender o seu cachimbo.
Mas, o Vento do Mar soprava forte e o isqueiro apagava.
Então, chegou Cassiano Vieira, o leiloeiro da paróquia. Sentou-se ao lado de Joaquim Maestro, fez uma concha com as mãos, protegeu o isqueiro do vento, o cachimbo foi aceso em paz e pronto: fumaça no ar.
Joaquim Maestro soltou uma gostosa baforada e sorriu.
Cassiano Vieira puxou prosa.
--- Estou intrigado com uma coisa, Maestro!
--- Diga.
--- Como é que a gente entra no céu?
Joaquim Maestro puxou mais fumaça do cachimbo, soltou no ar, não cuspiu, por uma questão de boa educação, e respondeu:
--- Engraçado. Eu sonhei uma noite dessas que tinha morrido.
--- Não diga, Maestro.
--- Dei de cara com São Pedro e ele me olhou sorrindo. Perguntei: Aqui é o céu? E ele respondeu: Não, ainda não. O céu fica mais em cima. E me explicou: Está vendo essa escadaria? Está vendo essa caixa de giz? O senhor pega um giz e vai escrevendo em cada degrau o pecado que cometeu em vida. Quando terminar de escrever todos os pecados, a escada acaba e o senhor está no céu. Mas, quero avisar desde já: não adianta esconder pecado, porque a escada só acaba com todos os pecados contados. Então, comecei a escrever. Um pecado atrás do outro. Já estava até ficando cansado. E adivinhe quem eu encontro na escadaria, vindo lá de cima?
--- Quem, Maestro?
--- O Eduvirge Monteiro.
--- O falecido Eduvirge Monteiro?
---O meu compadre Eduvirge, que havia falecido há poucos dias. Fiquei tão contente que gritei: compadre, meu compadre! Que bom que você veio lá do céu me ajudar! E ele respondeu apressado, descendo a escadaria: Que céu, que nada, Maestro. Vou pedir mais giz para São Pedro que o meu acabou.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

SEMANA DO PREFEITO. DE 1 A 8 DE JULHO. ANO 1. NÚMERO 25



"Exmo.sr. Prefeito:
Quero confessar o medo que tenho de perder minha cidade.
Não pense, senhor Prefeito, que é exagero deste cidadão.
É que na cidade onde nasci, há muito tempo atrás, existia uma escola de música mantida pela Prefeitura.
Crianças e homens feitos passavam por lá. Um tempinho de nada. E aprenderam nota por nota, compasso a compasso, como deixar Deus mais por perto sem necessidade de nenhum sermão.
Bastava um dobrado, uma valsa ou um chorinho e coração duro logo se amansava e olhar assim meio torto se endireitava.
Deus é feito de música, dizia Tapichi, o mendigo eterno, para quem entendia sua linguagem.
A música alivia o peso do concreto armado sobre nosso espírito.
Então, Música Maestro!
Essa é a ordem que andou faltando em tantas cidades que se acabaram.
Campinas, Ribeirão Preto, Sorocaba e estrada afora são muitas as que morreram ou agonizam.
A morte de que falo é feita de aço, ferro e cimento. A busca do superavit.
E o deficit fica com o espírito.
Uma cidade com o espírito em deficit está morta.
A Internet, a TV, o celular apenas disfarçam o cemitério onde a vida não tem mais sentido nem valor.
Para quem já está morto, matar não significa nada (os alarmantes indíces de violência estão marcados com cruzes em todos os cemitérios).
Música, Maestro!
Senhor Prefeito: como seria bom um despacho assim sair de seu gabinete. E de repente ressurgir uma escola, um mestre e novos músicos revelados.
Como seria bom rever as lâmpadas acesas no coreto, estantes arrumadas, a vida a dar uma volta num domingo feliz no largo da matriz.
Não se trata de saudosismo bobo.
A vida de volta é uma questão urgente. Antes que a morte nos separe dela.
Música, Maestro!"

sábado, 20 de junho de 2009

Semana do Balão. 23-30/06. Ano 1. No.24 TAPICHI E SÃO PEDRO

Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel Arcanjo (às vezes ele aparece), contou a conversa que teve com São Pedro numa noite dessas, ali na beira do Guapé:


--- Boa noite, Tapichi.
São Pedro apareceu assim de repente e eu respondi meio assustado:
--- Boa noite, São Pedro.
--- Conte como anda a ordem por aqui, Tapichi?
--- Uma desordem, São Pedro.
--- Por que?
--- Porque não existe mais diferença entre homem e mulher.
--- Claro que existe. Deus criou o homem com alguma coisa que a mulher não tem e a mulher foi criada para procurar aquela coisa.
--- Pois tem homem escondendo a coisa e mulher aparecendo com ela.
--- Que coisa, meu Deus!
---A maior confusão, São Pedro. Nem o homem nem a mulher sabe mais qual dos dois é homem ou mulher.
--- Acho bom falar com Santo Antônio.
--- Não é preciso, São Pedro.Até agora ninguém reclamou.
---Está bem, está bem. E a vida?
--- Vazia, São Pedro. Ôoo vida vazia. Até o padre está de saco cheio.
--- O padre? Mas, isso é um grande pecado.
--- Mas, ninguém sente mais culpa nem tem medo de castigo. Por isso mesmo é que o padre está de saco cheio.
---Mas, quem acabou com a culpa?
--- Dizem que foi um tal de Sarney, que eu, lá no meio do mato, nunca ouvi falar.
--- Sarney? Se não me engano, estou com o curriculum dele.
--- A culpa é que tinha graça, São Pedro. Houve um tempo em que a gente sentia culpa quando pulava a cerca. Hoje, com tanta porteira aberta, sentir culpa do que?
--- Meu Deus!
--- Houve um tempo em que não se dizia o nome de Deus em vão. Hoje, o nome de Deus passa até pelo vão da boca de senador.
--- E a dignidade?
--- Não existe mais dignidade, São Pedro. Decência, honestidade, ombridade é tudo em vão. E quem protesta, arruma sarna pra se coçar. Sarna ou Sarney.
--- Estou assustado, Tapichi.
--- Tem mais São Pedro: Lembra daquele mandamento para não cobiçar a mulher do próximo?
--- Claro que me lembro.
---E quem é o próximo, São Pedro?
--- O próximo é o companheiro da mulher, Tapichi.
--- Era, São Pedro. Hoje, as mulheres mudam tanto de companheiro que ninguém cobiça mais nada com medo de ser o próximo.
--- Jesus, me acuda.
--- E por falar em cobiça, São Pedro, hoje quem tem, põe mais. Quem não tem, tira.
--- E o mandamento "Não roubarás!" como é que fica, Tapichi?
--- Quer um conselho, São Pedro? Se o senhor cismar de andar um dia pela Terra cuidado com as chaves.
--- Por que?
--- Porque podem roubar o céu do senhor.
--- Espero que pelo menos estejam honrando Pai e Mãe, Tapichi.
--- Passe no asilo que o senhor vai ver que filhos andam por aqui.
--- Filhos da...
--- Calma, São Pedro.
--- E o mandamento "Não matarás!", Tapichi?
--- Ah, se o senhor conhecesse o Bush e a Favela do Alemão...
--- Espero que você não esteja dando um falso testemunho, Tapichi.
--- Falso testemunho? Eu? De jeito nenhum. Falso testemunho quem dá sempre é no Jornal das Oito da TV. É um primeiro de abril atrás do outro.
--- Meu Deus, tudo isso parece o fim do mundo.
--- Mas, o fim do mundo já começou, São Pedro!
--- Não diga! Começou onde, como?
--- Com a novela da Globo. Milhões de pessoas mortas na frente da TV. Mortas sem receber a extrema-unção.
--- E os padres?
--- Ou estão mortos também ou de saco cheio.
Então São Pedro, muito desolado, pegou a estrada de Capão Bonito e antes de voltar para o céu, gritou:
--- Salve o Guapé, Tapichi!

domingo, 14 de junho de 2009

SEMANA DO BUSCAPÉ. DE 16/06 A 23/06. ANO 1 - EDIÇÃO 23


BUSCAPÉ PARA DESCER DO MURO

Nada como soltar um buscapé bem lá na região da indecisão e que vire morteiro o que estava morto e um homem renasça e desça do muro.

BUSCAPÉ PARA RABO PRESO

Nada como soltar um buscapé em redemoinho na direção dos que venderam a alma ao diabo e que pegue fogo o rabo preso deles (não falei, não vi, não ouvi).

BUSCAPÉ PARA QUEM NÃO ANDA DIREITO


Nada como soltar dois buscapés, um para cada pé, e endireitar o passo de quem pensa que o torto é que é direito (No Chaplin não vale. Ele foi o único que pelo torto ensinou o que é direito)

BUSCAPÉ PARA SAPATÃO


Nada como soltar um buscapé bem rente ao chão, no meio dessas mulheres que fazem passeata pelo direito de ter um saco, e elas vão querer de novo um salto alto.

BUSCAPÉ PARA CDF


Nada como soltar um buscapé nesses CDFs de tanta seriedade e pés no chão. Que eles gritem e pulem de susto e percam a certeza de que tudo é certo, pois a vida é aventura e o imprevisto é da maior gostosura.

Mastro Górvo:uma historinha a moda italiana



Muito do nosso jeito caipira de falar (e até a moda de viola) vem dos imigrantes italianos, que pegaram a Língua Portuguesa do jeito que deu e fizeram uma bela pizza.
E ninguém brincou melhor com essa linguagem do que o escritor Alexandre Marcondes Machado (1.892-1933), um paulistano que aprendeu com os italianos a amar a cozinha, as mulheres e a vida e que escrevia sob o pseudônimo de Juó Bananéri.
Acompanhem a graça desta história: Mastro Górvo.

Mastro Górvo
Num gálio sintadinhe
Tenia no bicón
Um pézzo de formágio

Mastro Rapóso
Sintindo um cheirinhe
Parlou nisto linguágio:

--- Eh, dotóri Górvo! Bom di! Como estai o sinhore? Estai bonzinhe? Como o sinhore é bunitinhe! Te parece una Giuriti! Parlando a verdade pura, oh, chirosa criatura, si vostro linguágio é uguali a vóstro plumágio, giuro per San Benedicto que in tuto questo distrito no tem otro passarinhe qui seja mais ...ê... bunitinhe.
O Górvo ficô ton inchado com estas adulaçon qui até parecia o Rodorfo no tempo da intervençón.
I pra mostrá o linguágio abriu os bruto bicón i deixô caí o formágio qui o Rapóso logo pigô. E disse:
--- Sô Górvo, o sinhôre é um coió, o piore do capitó. Ma aprinda bem esta liçon e non credite nunca mais em adulaçon.
O Górvo, danado da vida, com o logro qui ilo levô, pigô um pedaço di corda e sinforcô.






domingo, 7 de junho de 2009

SEMANA DA PIPOCA. DE 09/06 A 15/06. ANO 1 - EDIÇÃO 22


As quadrilhas de Brasília são conhecidas no mundo inteiro, mas nada se compara à gostosura das quadrilhas de São João em São Miguel Arcanjo.

Por que não adotar uma criança vira-lata?

Eram bons tempos. Não havia crianças vira-latas nas quermesses de São João. Mas, elas se espalharam pelo país inteiro.
E num momento em que a onda dos novos ricos é adotar cães ou gatos, a única saída dessas crianças talvez seja aprender a latir e erguer a perna para fazer xixi (no caso dos machos). Quem sabe, alguma madame possa gostar.

Os grandes homens têm marcas de calos nas mãos


Quando um ministro do meio-ambiente entra no mato de colete, ai que saudade que dá da camiza xadrez e do chapéu de palha dos caipiras que tinham calo nas mãos e nunca esmaltaram as unhas para abrir picadas e desbravar este país.

Ai, que saudade da Carula

1.
A farra do premier italiano Silvio Berlusconi trouxe uma saudade danada da Carula, primeira ministra da Zona, que ficava alí na saída para Capão Bonito. Na Carula, a farra não era de homem com homem nem de mulher com mulher e faca tinha ponta e galinha arisca botava ovo em pé.
2.
Quando se vê que mulher de rico ou famoso é quase sempre uma oportunista em busca de milhões,
de novo bate uma saudade da Carula, principalmente nos tempos de festas juninas. Ela subia no pau de sebo para ganhar tão pouco...


quarta-feira, 27 de maio de 2009

AS SETE PRAGAS DE BRASÍLIA

PELA MAIS TERRÍVEL E INVISÍVEL FEITICEIRA DE SÃO MIGUEL ARCANJO:

DONA CHICA.




1. VENTRE LIVRE


"Se nem prisão de ventre pega corrupto, chamo a força de descarrego de todos os Caboclos da Mata para que dê a essa gente um Ventre Livre e solto e que a água da descarga não pese na conta do povo brasileiro. "


2. LÍNGUA NA ENCRUZILHADA




" Chamo a Força da Encruzilhada para que os políticos corruptos se percam nos seus discursos. E que a língua deles confunda a direção a seguir. Em vez de ponto de exclamação (Nesta Casa impera a decência e a honestidade!) que entre a interrogaçao (Nesta casa impera a decencia e a honestidade?) E que eles babem as palavras e caiam pingos em todos os is dos indecentes, inconscientes, inconfiáveis, ignorantes, ignóbeis, intrigantes, inúteis, irresponsáveis, indolentes, inidôneos.

3.BOCA DE SAPO "Chamo o Senhor dos Pântanos para castigar com uma boca de sapo quem preenche o expediente com discursos e apartes inúteis. E que dessa boca saia um discurso só: Foi gol!!! E um aparte só: Não foi!!! E que tudo vire uma saparia: Foi gol! Não foi! Foi gol! Não foi!"

4.ZUMBIDO ETERNO


"Chamo o Besouro Mensageiro da Escuridão para que um zumbido de avião fique para sempre nos ouvidos de quem manda a família passear com as passagens aéreas que o povo paga.
"


5.DEDO PRESO


"Chamo Pimpão, o gnomo brincalhão, para que o dedo em riste dos cínicos e falsos moralistas fique preso nos íntimos recônditos onde esse dedo passa todas manhãs. "

6.ATAQUE DE FRESCURA


"Chamo Bichin, o gnomo protetor das Margaridas, para que provoque um arrasador ataque de frescura em todo parlamentar que costuma socar o ar ou esmurrar a mesa numa falsa demonstração de honestidade. E que sua voz se afine e ele desmunheque descontroladamente."

7.COCEIRA ETERNA


" Chamo o espírito do Vento do Mar para que carregue esta porção de pó de mico até o Congresso e que uma coceira eterna não deixe mais desocupadas as mãos leves que fazem o povo brasileiro coçar a cabeça. "



terça-feira, 26 de maio de 2009

o mundo cada vez mais louco

O sábio Tapichi, o eterno mendigo da Paróquia de São Miguel Arcanjo, mais uma vez apareceu de repente no largo da Matriz, subiu num banco e começou a gritar:
--- Que mundo é este de onde eu já voei? Que mundo é este? Já estão vendendo papel higiênico preto! Meu Deus! Para a loucura ficar completa só falta fazer cocô no escuro!
Mais endoidecido ainda, Tapichi continuou a gritar:
--- Querem mais??? O desodorante Avanço agora também patrocina o Corintians. A marca vai ficar bem ali no sovaco do time. Imagine só aonde vão colocar a marca quando o patrocínio for da Hemovirtus. No meu, não, no meu, não...
E Tapichi desapareceu no ar.

sábado, 23 de maio de 2009

barbeiro gabino martins. careca de raiva.

Tapichi, o eterno mendigo de São Miguel (às vezes, ele aparece), contou que raparam a cabeça dos que não pagaram a conta do Gabino e todos foram expulsos para Pilar do Sul. Ele, não, pois nunca cortou barba nem cabelo e nunca deveu nada a ninguém.
(Jornal A Razão, de julho de 1.923. Arquivo de Paulo Manoel)

Ela (não é bom dizer seu nome) cantava que não acabava mais. Ela e o galo.
Todo santo dia, toda santa hora, ela cantava de um lado e o galo do outro.
O marido (não é bom dizer seu nome) apareceu um dia coçando a cabeça na barbearia do Gabino:
--- Estou numa dúvida danada, seo Gabino. Não sei se destronco o pescoço do galo ou da minha mulher. Não aguento mais a cantoria dos dois.
--- Quer um conselho? Destronque o pescoço do galo.
--- Mas, o galo canta mió, seo Gabino!!!

e benedito terra devolveu a porca...


NESTE PAÍS, ONDE É MESMO QUE A PORCA TORCE O RABO?
LEIAM O AVISO ABAIXO, PUBLICADO EM MAIO DE 1.923.
ELE SERVE PARA TODOS OS QUE EXERCEM O PODER SEM NENHUM PINGO DE HONESTIDADE E QUE, COM CERTEZA, JÁ TERIAM COMIDO A PORCA SEM AVISAR O DONO.
Publicado no Jornal A Razão. Do arquivo de Paulo Manoel.

alfaiate agenorzinho, mãos de tesoura

Agenorzinho era um artista dos ternos sob medida. Mas, não dava muita trela à freguesia. Era gago e enfezado. E quanto mais enfezado, mais gago ficava.
Certa tarde, o Zé Trincheira (José Monteiro Terra) entrou assim de repente na alfaiataria, sacou um 38 (sem balas) e gritou:
--- Que história é essa de você espalhar por aí que eu não pago meus ternos?
--- Eu??? Mas, eu nun... nun... ca... di...disse... na...nada!
--- De amigo da onça como você eu tapo a boca com bala!
--- Pe...pelo a..amor de...de... Deus, o que que é isso?
E Zé Trincheira puxou o gatilho.
Escondido, rente à parede, próximo da porta, Chico Terra, primo de Zé Trincheira, estourou no mesmo instante três bombinhas de São João. E Agenorzinho gritou aflito, com as mãos no peito:
--- Trin...Trincheira! Vo...você me ma...matou.
E caiu desmaiado.
(Os três eram grandes amigos)

sexta-feira, 22 de maio de 2009

bons tempos em que os burros eram amestrados

Bons tempos em que não havia Internet nem novela de TV, mas havia jornal de verdade e não havia propaganda nem noticia mentirosa e havia carroças e havia burros amestrados e havia vida. Mas, o mundo mudou: só restaram burros chucros.
(do arquivo de Paulo Manoel)

quarta-feira, 20 de maio de 2009

um sonho bem porquinho

--- Manhêee!!! Eu não quero ser salsicha quando crescer. Também não quero ser linguiça. Eu quero ir pra Brasília.
Alguns pobres porquinhos estão confusos com seu destino original. Eles nem sabem mais a diferença entre lavagem comum --- que é a comida dos porcos --- e a lavagem de dinheiro --- que é o prato preferido de certa raça de porcos emergentes.
miguel arcanjo terra