quinta-feira, 25 de março de 2010

ANIVERSÁRIO DE SÃO MIGUEL ARCANJO. PRIMEIRO DE ABRIL!

Tapichi, no seu mundo transparente.

Tapichi, o mendigo eterno (às vezes, ele aparece), manda de seu mundo transparente uma mensagem em razão do aniversário de São Miguel Arcanjo.
"É Primeiro de Abril, meus amigos. A cidade não existe. Nem você nem eu.
Se a cidade existisse (eu e você, também) a gente iria comprar picolé de groselha no bar do Salomão. Mas, cadê o Salomão?
Se a cidade existisse, a gente passaria no Abdalinha para rir com ele e comer um Bauru. Mas, cadê o Abdalinha?
Se a cidade existisse, a gente pediria ao Jorge ou à Tia Amélia um quibe ou um pastel, feito assim na hora, com barulho de óleo quente na frigideira, barulho de mãe. Mas, cadê o Jorge e a Tia Amélia?
Se a cidade existisse, o Suel estaria no balcão, ali bem na esquina da praça, a dizer em seu silêncio que para ser santo não é preciso ir a Roma nem ver o Papa. Basta ser manso de coração e perdoar as dívidas e os devedores. Mas, cadê o Suel?
Se a cidade existisse, o Lauro e suas lindas filhas estariam na padaria a dividir o pão da manhã e a confiar na palavra ou caderneta dos que não liam o aviso: Fiado só amanhã. Mas, cadê o Lauro e suas lindas filhas? E cadê os pães da madrugada do Chico Rosa, que eram passados pela janela para bêbados famintos que chegavam das serenatas com a fome de quem cantou muito, para tantas moças, mas comer que é bom, nada?
Se a cidade existisse, o Décio do Policarpo estaria com roupas novas e pose de galã para dançar com a garota mais cobiçada, no salão do clube Bernardes Júnior, e os mais feios morreriam de inveja. Mas, cadê o Décio?
Se a cidade existisse, João Ortiz, no saxofone ou clarinete, Zé Ortiz na bateria, Darcy Ortiz nos pratos, Tonico Ortiz no trompete e Joaquim Maestro na regência estariam tocando um chorinho, talvez de Pixinguinha ou Zéquinha de Abreu, para que almas se encantassem e percebessem que a vida só é vazia para quem não percebe a Lua Cheia. Mas cadê o chorinho? E quem liga para Lua Cheia nestes tempos?
Se a cidade existisse, o goleiro Dito Torto, os beques Romeu e Salvador Costa, o center-half Trincheira, o ponta Valdemar Coelho, o meia Nê Terra--- e tantos outros heróis--- estariam com o uniforme de guerreiros do Esporte Clube São Miguel para enfrentar os invasores de Pilar do Sul ou Capão Bonito. Mas cadê o campo de terra e de guerra?
Se a cidade existisse, o Cine São Miguel, às oito da noite, tocaria a última chamada e Pedrinho Ortiz, na portaria, resmungaria pelo atraso dos que deram um giro a mais na praça. Então, mãos no escuro apalpariam zonas proibidas e os que tinham esperança de um beijo mascariam chiclete e ficariam com água na boca os que estavam sós.
Mas, cadê o cinema do Foued?
Cadê o sorriso da Arima na loja do Harif?
Cadê a graça da Carmem Fogaça?
Cadê o canto de Irene, um canto triste na Via Cruxis de Jesus?
Cadê o palavrão do Zacarias ou do Elias?
Cadê a barriga do Nagib?
Cadê os exageros do Abrão Hakim?
Cadê os resmungos do Pajé?
Cadê o chapéu do Nestor Fogaça?
Cadê o vozeirão do Zé França?
Cadê o salão de barbeiro do Paulico?
Se a cidade existisse, haveria leilão e Cassiano Vieira gritaria: Quanto me dão por este leitão?
Ah, se a cidade existisse, que bom seria.
Mas, é Primeiro de Abril. São Miguel Arcanjo e todas as cidades brasileiras viraram mentira com a novela das oito, com o futebol do Galvão Bueno e seus clones e com o Big Brother. E nada mais existe: nem você, nem eu."


sexta-feira, 12 de março de 2010

POR QUEM OS SINOS DOBRAM


28.08.1940
10.03.2010


ANTONIO TERRA, O TONINHO,
SE TORNOU INVISÍVEL


Os olhos verdes, o sorriso tímido, o corpo de um Adonis, capaz de caminhar léguas de São Miguel a Iguape, andando com fé, que a fé não costuma falhar.

O Sim escancarado para a vida e o Não sempre escondido.

O sábio recato e mansidão de quem não cai nem perde a compostura depois da penúltima dose. E se cair, Deus levanta.

O amor declarado sem palavras, mas na ternura de um olhar.

O brio de vencer dores e desgostos quieto e sem lamentações.

Menino-homem, Homem-menino, Toninho acaba de se tornar invisível.

Talvez agora ele seja um vento manso que ondula os trigais.

Talvez uma réstia de luar que serena os namorados.

Talvez a chuva mansa que bate em humildes telhados e faz uma criança dormir.

Agora, invisível, Toninho é tudo o que sempre foi e nenhum de nós teve olhos para ver.

Talvez, um dia teremos e os sinos da Igreja Matriz de São Miguel Arcanjo serão ouvidos bem longe.


Homenagem de seus irmãos Inês, Gracinha, Miguel, José Carlos, Luiz Carlos. Da mulher, Carmélia. Dos filhos Ricardo e Patrícia. E de todos os netos, cunhados e sobrinhos.