sábado, 16 de maio de 2009

ESSE DENTE EU NÃO PAGO

Ademar Monteiro foi o primeiro dentista de São Miguel Arcanjo, com formação superior.
Seu pai, Eduvirge Monteiro, era dentista apenas pela prática.
Poucos dias depois de montar seu consultório, na própria sala do seu pai, apareceu o primeiro cliente. Veio lá do Turvinho. Caboclo forte e bravo, mas gemia de dor de dente. Ressabiado, sentou-se na cadeira novinha, cheia de etecéra e tal, como dizia o Cassiano Vieira. Logo perguntou:
--- Seo Eduvirge já vem?
--- Não, senhor. Estou no lugar dele. Sou seu filho.
--- Ai, ai, ai... Óia bem o que o senhor vai fazer!
--- Acabei de me formar em Sorocaba. Cirurgião dentista.
--- Óia!!
--- Fique tranquilo. Conheço muito bem meu ofício.
--- Óia!!!
--- Abra a boca, por favor!
--- Óia!!!
--- Nossa! Esse dente não tem mais jeito. Só mesmo uma extração.
--- Óia!!!
Em pouco tempo, Ademar Monteiro preparou a anestesia, aplicou a injeção, esperou um pouquinho, apanhou o boticão, fez a extração num arranco só e, orgulhoso, apresentou o dente ao seu primeiro cliente:
--- Prontinho. Taí o danado.
Surpreso com tamanha rapidez, o caboclo ficou de boca aberta um bom tempo, antes de perguntar desconfiado:
--- Mas esse dente é meu?
--- Era. Agora vai pro lixo.
--- E quanto ficou o serviço?
--- Cinco mil réis!!!
O caboclo saltou furioso da cadeira:
--- Cinco mil réis? Ah, não pago. De jeito nenhum.
--- Mas, por que?
--- Porque da última vez que arranquei um dente com seu pai, eu e ele lutamos mais de uma hora, caí da cadeira, rolei no chão, ele não largava o alicate, eu não largava o braço dele, eu gemia de cá, ele bufava de lá, viramos até a bacia dágua. Uma peleja e tanto. Sabe quanto ele cobrou? Um mil réis. E agora vem você cobrar cinco mil réis sem fazer força nenhuma e sem doer nada? Não pago.





Um comentário:

  1. Cada uma! Os 4 mil réis seriam por não ter tido a dor, mas pelo jeito...

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